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quinta-feira, 30 de novembro de 2006

Quase fomos o que quisemos. 

Cartier-Bresson, Traseiras da Gare de Saint Lazare, 1932
Henri Cartier-Bresson [1908-2004]. Traseiras da Gare de Saint Lazare. 1932

Ao longo da minha vida fui traçando muitos objectivos, muitas pequenas e grandes metas que gostaria de alcançar, que achava fundamental alcançar. Durante muito tempo, investi nesses objectivos e direccionei para eles muita da minha atenção, muito do meu tempo, muita da minha dedicação, muita da minha energia, muita da minha paixão, muito do meu amor, muito de mim.*
Alguns desses objectivos foram cumpridos, outros não. Reconheço-o com tranquilidade. Penso que é tão importante saber festejar as vitórias como encarar de frente as derrotas. Perdi muitas das apostas que fiz com a vida e sei que muitas mais perderei.
Nem sempre conseguimos ser aquilo que queremos ser. Entre a nossa vontade e aquilo que conseguimos fazer vai uma grande distância, que é percorrida pela sorte, pelas oportunidades, pelo tempo certo, enfim, por um sem número de circunstâncias que não estão sob o nosso domínio. Digamos que no caminho das nossas metas, nem sempre «querer é poder»; muitas vezes, o «querer» só faz metade do caminho e deixa a outra metade por conta do acaso ou da vontade alheia.
Às vezes caímos na tentação de fazer batota com a vida, especialmente quando os caminhos que traçámos, as metas que almejamos têm de ser percorridas a dois. Às vezes, achamos que somos capazes de decidir pelo outro, de pensar pelo outro, de sentir pelo outro. Às vezes achamos que reunimos em nós tudo o que é necessário para que o outro decida de acordo com o que nós queríamos, com o que nós gostaríamos, com o que nós sonhámos, com o que nós idealizámos. Só que, às vezes, não reunimos.
No caminho para a realização dos nossos sonhos devemos dar o melhor de nós, mas conscientes de que, às vezes, o melhor de nós não chega. Às vezes, nós inteiros não chegamos para chegar à meta. Às vezes, querer não é poder. E perdemos as apostas. E os objectivos ficam a meio, juntamente com o nosso esforço, o nosso desejo, o nosso sonho, a nossa dor. A vida nem sempre nos dá tempo de parar, chorar, sair, levantar do chão, como se diz na música dos Toranja. Desata a gritar-nos ao ouvido que continuemos a correr, mesmo que tenhamos de encharcar os pés nas poças de água da chuva, mesmo que estejam 40 graus Celsius lá fora, mesmo que o caminho seja íngreme, mesmo que estejamos atordoados e já não tenhamos sequer noção de quais são as metas que queremos atingir. Muitas vezes, o turbilhão provocado pela continuidade impediosa do tempo é tanto que quase nos esquecemos de quem somos. E às vezes, quase esquecemos quem somos só porque o outro não nos vê.
Quando isso me acontece, procuro dentro de mim o equilíbrio que passa por reconhecer que o objectivo, apesar de todo o meu empenho, todo o meu sonho, apesar de tudo, não se concretizará. Já aprendi que, na vida, nem todas as apostas são para ser ganhas, nem todos os sonhos são para realizar, nem todas as metas são para alcançar. Mas devo a mim própria dar o meu melhor mesmo perante essas apostas, esses sonhos e essas metas. «Querer» é dar o meu melhor, dar tudo, se preciso for. Se não quiser o bastante, nunca serei. Mas se eu quiser muito, pode ser que chegue ao fim da vida com a tranquilidade bastante para poder dizer, quando estiver frente-a-frente comigo mesma, que quase fui o que quis, que quase fomos o que quisemos.

* Uma dessas realizações está bem diante dos vossos olhos e dá pelo nome de Assumidamente.

Na grafonola: Cada vez mais aqui, dos Toranja [Esquissos, 2003].

Cada Vez Mais Aqui
Toranja

Queres lutar com quem?
Para doer aonde?
Para ser o quê?
Achas que ninguém vê?

E para quê fingir?
Porquê mentir
e remar na dor?
Achas que ninguém vê?

Também eu queria parar, chorar, cair...
para me levantar,
para te puxar!
Te fazer sorrir...
não voltar a cair!

Não me olhes assim!
Continuo a ser quem fui!
Cada vez mais aqui...
não dances tão longe...
que eu já te vi.

Também eu queria parar, chorar, cair...
para me levantar,
para te puxar!
Te fazer sorrir...
não voltar a cair!

segunda-feira, 27 de novembro de 2006

Cesariny [1923-2006] 

Foi já ontem que o Mário Cesariny de Vasconcelos começou a rir-se de nós, mas para ele não há, nunca houve, calendário. Despediu-se definitivamente da realidade e passou a viver no Espaço e no Tempo onde sempre se movimentou: o Sonho. O Cesariny, o génio Cesariny, mostrou que o surrealismo não é vago, que é possível vivê-lo em cada instante. Foi-se embora, mas ficou; partiu, mas acaba de chegar; disse adeus mas continua a cruzar-se connosco.
Que sejas bem acolhido, Mário, em Elsinore.


Lembra-te

Lembra-te
que todos os momentos
que nos coroaram
todas as estradas
radiosas que abrimos
irão achando sem fim
seu ansioso lugar
seu botão de florir
o horizonte
e que dessa procura
extenuante e precisa
não teremos sinal
senão o de saber
que irá por onde fomos
um para o outro
vividos


Mário Cesariny de Vasconcelos, Pena Capital II

sexta-feira, 24 de novembro de 2006

Lealdade vs. Fidelidade... e a liberdade de expressão 

Advertência: o texto que se segue é da inteira responsabilidade de quem o escreveu, não tendo como base qualquer estatística, teoria ou pensamento que não as que, ao longo da vida, se foram formando na cabeça da autora.


Lealdade vs. Fidelidade

A meu ver, há uma diferença muito grande entre Lealdade e Fidelidade. Tão grande, mas tão grande, que uma nada tem a ver com a outra. O mais infiel dos seres pode ser o mais leal (geralmente, é), enquanto que o mais fiel pode ser o mais desleal (geralmente, também é).
A fidelidade prende-se com o respeito pelos compromissos que se assumem perante uma pessoa, enquanto a lealdade tem a ver com o respeito devido à própria pessoa, isto é, ao seu âmago enquanto indivíduo, algo de tão precioso e tão delicado a que chamamos frequentemente dignidade do ser humano. Além disso, a fidelidade existe somente no contexto amoroso e no contexto dos negócios (de certeza que já ouviram falar dos contratos de fidelização das operadoras telefónicas...), enquanto a lealdade existe em relação a todas as pessoas, principalmente àquelas com quem estabelecemos relações de proximidade (profissionais, amorosas, de amizade, etc.). Simplificando (muito) a coisa, eu diria que a infidelidade fere o orgulho, enquanto a deslealdade fere a dignidade.
A infidelidade põe fim ao compromisso, mas não impede que nasçam outros, novos. Depois da infidelidade podem surgir novos compromissos, assumidos perante as mesmas ou perante outras pessoas, basta que a isso ambas estejam dispostas. Contudo, a deslealdade não pode dar lugar a outras pessoas, a novas pessoas, porque as pessoas não se "fabricam", não se criam por acordo.
Assim, para mim, a lealdade é muito mais importante do que a fidelidade, porque as pessoas têm muitíssimo mais importância do que os compromissos. Os compromissos começam e acabam, renovam-se, são substituídos, voltam a começar e a acabar. Mas as pessoas que passam pela nossa vida, essas, deixam marcas eternas, indeléveis e, em certa medida, diria até que nos constroem.
O dever de fidelidade cessa quando cessam os compromissos; o dever de lealdade para com o nosso semelhante não cessa depois dos compromissos, não cessa sequer depois da morte, porque depois da morte há ainda um nome e uma memória a respeitar, à qual devemos um comportamento leal. É por isso, julgo, que a infidelidade se perdoa, se esquece, tem importância diminuta e não faz de ninguém um ser menor, mas tão somente humano (desenganem-se os que ainda pensam que há pessoas 100% fiéis, pois tal coisa não existe, a não ser que se defenda que a infidelidade é somente física). E é também por isso que a deslealdade é vergonhosa, inesquecível, inapagável e imperdoável.
A infidelidade é algo que devemos evitar a todo o custo, é algo de que não devemos orgulhar-nos e que é, do ponto de vista das relações humanas honestas, incorrecto. Mas a deslealdade, car@s amig@s, a deslealdade é uma filhadaputice inqualificável.


A liberdade de expressão

Quem discordar desta minha análise tem a caixa de comentários aberta para dizer de sua justiça, que neste blog não se corta a palavra a ninguém, mesmo que as pessoas critiquem o que aqui é escrito. A crítica é uma das componentes da liberdade de expressão que deve ser respeitada, porque formar opinião sobre nós, seja pelo que escrevemos, seja pelo que fazemos, é um direito que todas as pessoas têm. Quem vive no mundo real sabe que está sujeito, a todo o instante e legitimamente, a juízos de valor. Se quer que sejam positivos, esforça-se por isso; se quer que sejam negativos, não. Por isso, desde que não se digam mentiras (mentiras é que não, car@s amig@s, que inquinam as conversas e têm perna curta!), digam-se todas as verdades, dêem-se todas as opiniões, façam-se todas as críticas, que a ditadura já foi abolida em Portugal faz tempo e nunca existiu no meu universo pessoal.
Por isso, minhas e meus querid@s leitor@s, exorto-vos a que cliquem ali nos «comming outs» e escrevam, escrevam muito, refilem, critiquem, apontem os erros, louvem as correcções, aplaudam se tal vos aprouver, que eu tenho um prazer imenso em ler-vos e em pensar convosco, em aprender convosco, em crescer convosco! :)

segunda-feira, 20 de novembro de 2006

No coração 

O mEiA vOlTa e... faz hoje três anos: três voltas inteirinhas que se completam hoje! Poderia dizer muita coisa, escrever um texto muito longo e muito bonito (eu sei que estou a ser convencida por estar a dizer que escreveria um texto muito bonito, mas eu sou mesmo assim, já sabem do que a casa gasta!) sobre um dos primeiros blogs com que criei uma relação de autêntica afectividade. Mas tenho uma sugestão muito melhor para ocupar o vosso tempo. A aNa diz de si e sobre si muito melhor do que eu aqui: ide e lede, saireis de lá mais ric@s.

À minha querida prima aNa digo apenas que é uma das preciosidades que a vida me concedeu e que com ela, como se não fosse já enormíssimo o seu valor, ainda trouxe um "bónus" chamado Maria. É possível dar graças por tanto? Talvez não, minhas queridas primas, mas eu faço questão de tentar. É que não é em todas as vidas que alguém como eu tem oportunidade de estar "no coração" de alguém como vós. Porque o mEiA vOlTa e o Assumidamente foram os elos de ligação entre nós, desejo que estas luzinhas não se apaguem e que sejam estradas paralelas durante longo tempo, tanto como o das nossas vidas. À vossa, à nossa, ao mEiA vOlTa!

Adoro-vos bué e mai' nada! ;)

Um beijo da vossa
Prima Doida Varrida.

quinta-feira, 16 de novembro de 2006

Dia Internacional para a Tolerância 

O Dia Internacional para a Tolerância é uma chamada universal a uma das maiores virtudes da humanidade. A tolerância implica um empenhamento activo e a compreensão da riqueza e da diversidade da humanidade. Nas sociedades actuais, cada vez mais multiétnicas e multiculturais, constitui um dos princípios fundamentais da democracia e o fundamento da coexistência pacífica entre os povos.
Contudo, a intolerância continua a envenenar a existência de milhões de pessoas em todo o mundo. Ao longo dos últimos anos, fomos testemunhas da violência extrema com que se pode manifestar a intolerância, através de incontáveis mortes e grande sofrimento. É por essa razão que a tolerância deve estar no cerne das prioridades da UNESCO e das Nações Unidas.
[...] a tolerância não é nem concessão, nem condescendência, nem indulgência, mas sim uma atitude positiva de respeito e de reconhecimento mútuo, animada pelo reconhecimento dos direitos universais da pessoa humana e das liberdades fundamentais.
[...] a intolerância assenta sobretudo no medo: medo do desconhecido, medo da diferença, medo do outro. A ignorância e a ausência de educação estão na raiz destes medos. A educação de qualidade constitui o meio mais eficaz para prevenir a intolerância. É fundamental que as nossas crianças aprendam a tolerância, por forma a que possam compreender as razões pelas quais o respeito dos direitos da pessoa, da dignidade humana e da diversidade da humanidade são indissociáveis. Devemos contudo assegurar-nos de que o próprio ensino esteja isento do vírus da intolerância. A educação deve ensinar às pessoas quais os direitos e liberdades partilham, para que cada um possa respeitá-los e usufruí-los.
Neste Dia Internacional para a Tolerância pratiquemos activamente, ao nível individual, os princípios que desejamos ver universalmente respeitados, pois as acções em defesa da tolerância começam em cada um de nós.

Excertos da mensagem de Koïchiro Matsuura, Director geral da UNESCO, por ocasião do Dia Internacional para a Tolerância, 16 de Novembro de 2006.


A propósito da comemoração do Dia Internacional para a Tolerância, promovido pela UNESCO, convém lembrar que A HOMOFOBIA TAMBÉM É UMA FORMA DE INTOLERÂNCIA e que o véu da diferença não passa de uma fina película que esconde, afinal, a igualdade de todos os seres humanos.

Nota: post escrito com um olho no computador e outro na televisão, para não perder pitada da conversa do Dr. Pedro Santana Lopes com a jornalista Judite de Sousa acerca dos acontecimentos relacionados com a dissolução da Assembleia da República e consequente queda do seu governo. Só para que se saiba o quão tolerante eu sou... ;) [risos]

terça-feira, 14 de novembro de 2006

Nem toda a África é terceiro mundo 

A África do Sul tornou-se hoje o primeiro país africano a legalizar os casamentos entre pessoas do mesmo sexo. É importante realçar o facto de que a lei, apesar de ter dado lugar a um intenso debate não isento de polémica, foi aprovada com 230 votos, 41 contra e três abstenções, o que significa que entre os 274 deputados do parlamento sul-africano, a percentagem de votos a favor é muitíssimo expressiva, cifrando-se nuns louváveis 83,94%.
Da notícia do PÚBLICO sobre o assunto, destaco as palavras da ministra do Interior sul-africana, Nosiviwe Mapisa-Nqakula, que sublinham que esta lei reflecte o compromisso do governo em combater todas as formas de discriminação contra os homossexuais: «Rompendo com o nosso passado, necessitamos de lutar e resistir a todas as formas de discriminação e preconceitos, incluindo a homofobia.»
Mas não se pense que esta lei surgiu do nada. A precedê-la esteve uma decisão do Tribunal Constitucional do país que considerou inconstitucional a anterior lei do casamento, baseada na «união entre um homem e uma mulher», por ser contrária ao preceito constitucional que garante os mesmos direitos para todos os cidadãos (princípio da igualdade).
A África do Sul junta-se assim ao Reino Unido, à Holanda, à Bélgica, à Espanha e ao Canadá no (ainda pequeno) grupo de países onde os cidadãos homossexuais não são cidadãos de segunda.

Por cá, esta notícia não deixa de ser um alento para os que, como eu, defendem a consagração legal do casamento entre duas pessoas do mesmo sexo e, ainda, de modo especial porque surgiu no seguimento de uma decisão do Tribunal Constitucional, ou seja, pela via que há muito se vem defendendo neste blog. Este é mais um motivo para apoiar a cruzada da Lena e da Teresa, o casal de lésbicas portuguesas que pretende levar a apreciação da discriminação dos homossexuais em matéria de casamento legalização destas uniões pelo vínculo do casamento a todas as instâncias jurisdicionais nacionais e, se preciso for, ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.

E porque se insere no tópico, alguma divulgação. A informação está em destaque há já muito tempo na barra lateral do blog, mas aproveito a oportunidade para chamar a atenção para o Ciclo «A Tempestade e o copo d'água: sobre o casamento entre pessoas do mesmo sexo», organizado por Miguel Vale de Almeida e pela Livraria Almedina, cuja primeira sessão, intitulada «Da viabilidade jurídica do casamento entre pessoas do mesmo sexo», decorreu no dia 20 de Outubro e contou com a presença dos professores universitários Carlos Pamplona Côrte-Real e Teresa Pizarro Beleza. A próxima sessão, que conta com uma apresentação do organizador, será no dia 30 de Novembro, às 19h00 e terá como tema as «Questões antropológicas relacionadas com o casamento entre pessoas do mesmo sexo». A última conferência, «Da União ao Casamento – uma perspectiva sociológica sobre activismo LGBT em Portugal», está agendada para 15 de Dezembro e será proferida por Ana Cristina Santos, cuja dissertação de mestrado tratou do tema e se encontra editada pelas Edições Afrontamento (é só procurar no catálogo, comprar e, acima de tudo, ler!). Já agora, não deixem de passar pelo Lilás Com Gengibre, o blog da Ana Cristina Santos que hoje completa dois anos! Parabéns!
Informo também que, mais proximamente, no dia 27 de Novembro, decorrerá um debate intitulado «Identidade e cidadania: o activismo gay e lésbico», integrado no âmbito do VIII Colóquio de Sociologia, dedicado ao tema «Sexualidade: dilemas e (ind)definições», promovido pelo Núcleo de Estudantes de Sociologia da Universidade do Minho. O debate contará com as participação de Ana Brandão, docente universitária que tem a sua investigação a estes temas e de representantes das associações Opus Gay, Clube Safo e também do GRIP- Grupo de Reflexão e Intervenção do Porto da Associação Ilga-Portugal. O início está marcado para as 14h30 e terá lugar no Complexo Pedagógico 1 da Universidade do Minho, em Braga.

segunda-feira, 13 de novembro de 2006

Um privilégio 

Faz hoje um ano que foi lançado o último álbum de Madonna. A 13 de Novembro de 2005, Confessions On a Dance Floor invadia as lojas de música e milhares de fãs um pouco por todo o mundo resistiam nas filas para adquirirem um exemplar do tão aguardado disco. Umas semanas antes já o single Hung Up era presença mais do que frequente nas rádios e eu, lembro-me bem, não resistia a bater o ritmo com a mão no volante ao som do tic-tac com que a música arranca.

Time goes by so slowly... Time goes by so slowly... Time goes by so slowly...

Um ano volvido, esta manhã a mesma música agitou novamente as horas passadas no trânsito. Instintivamente cantei (sim, que eu sou daquelas que canta que se farta ao volante e abana a cabeça e faz coreografias com os ombros e os braços e tudo!) time goes by so slowly... Quando a música termina, ponho-me a pensar. «Time goes by so slowly? Se há coisa que o time deste ano não foi é slow! Não sei se sou só eu que tenho esta percepção, mas parece-me que 2006 passou a correr... É bem verdade que foi um dos piores anos da minha vida (sim, prima Maria, começo a acreditar na tal história dos ciclos de que me falaste...), mas tal como todos os anos que têm muitas coisas más, teve também coisas boas, momentos muito especiais, alguns deles mergulhados na tristeza mas ainda assim muito especiais. 2006 foi (a bem da verdade, ainda está a ser) um ano de enorme crescimento pessoal, de reforço de amizades, de lições de vida, de união familiar, de mudanças profissionais e de mudanças pessoais também. O ritmo de vida alterou-se e nem sempre bateu tão certinho como o tic-tac da canção da Madonna, mas o que é certo é que «esse comboio de corda a quem chamam coração»* não parou e embora o tic-tac tenha soado por vezes muito timidamente, marcou sempre o compasso no meu peito. O ano está prestes a acabar e tenho ainda tanto para fazer, dizer, ouvir, aprender, ver, experimentar! Tanto ainda para sentir! Acabo por concordar com a Madonna numa coisa: no time to hesitate. A vida é demasiado curta e veloz para vivermos tudo aquilo a que temos direito. Não quero que o tempo passe sem que eu dê por ele (tick tick tock it's a quarter to two!) e, por isso, está na hora de aproveitar o mês e meio que ainda resta deste ano e fazer com que ele valha a pena. Porque cada ano que vivemos é um privilégio que nos é concedido e que não podemos, de modo algum, desperdiçar. ;)

* verso de Autopsicografia, de Fernando Pessoa.

Na grafonola, previsivelmente, Hung Up, de Madonna.

segunda-feira, 6 de novembro de 2006

Só para mim, só comigo. 

Soa agora na grafonola o Rui Veloso, que comemora 25 anos de carreira. Quem estiver por Lisboa na próxima sexta-feira, dia 10, pode assistir ao último concerto Os Vês Pelos Bês, no Pavilhão Atlântico.
Tanto, tanto para dizer sobre a música do Rui Veloso e a companhia que me fez durante alguns anos! Tanto para recordar ao som das suas canções, tanto para trazer à memória de alguns dos seus concertos!... Mas esses momentos e essas palavras reavivo-os no meu peito e relembro-os só para mim, só comigo, agora que é o tempo de silenciar as emoções. Escolhi Eu Nunca Me Esqueci de Ti porque nunca me esqueci mesmo.
Para ti, em memória dos bons velhos tempos em que cantávamos o Porto Sentido sempre que passávamos a ponte da Arrábida, a caminho de casa...

Nunca me esqueci de ti

Bato a porta devagar,
Olho só mais uma vez
Como é tão bonita esta avenida!
É o cais. Flor do cais:
Águas mansas e a nudez
Frágil como as asas de uma vida.

É o riso, é a lágrima
A expressão incontrolada
Não podia ser de outra maneira;
É a sorte, é a sina,
Uma mão cheia de nada
E o mundo à cabeceira.

Mas nunca
Me esqueci de ti,
Não, nunca me esqueci de ti,
Eu nunca me esqueci de ti,
Não, nunca me esqueci de ti.

Tudo muda, tudo parte,
Tudo tem o seu avesso.
Frágil a memória da paixão...
É a lua. Fim da tarde
É a brisa onde adormeço,
Quente como a tua mão.

Mas nunca
Me esqueci de ti,
Não, nunca me esqueci de ti,
Não, nunca me esqueci de ti,
Eu nunca me esqueci de ti...

sábado, 4 de novembro de 2006

«o rosto de gregor samsa, naïve e nítido» 

desenho de valter hugo mãe desenho de valter hugo mãe

O poeta/romancista/editor/blogger/jurista valter hugo mãe inaugura hoje, na Galeria Símbolo, no Porto, uma exposição individual de desenhos intitulada «o rosto de gregor samsa, naïve e nítido», que reúne um conjunto de desenhos (dos quais fazem parte os dois que ilustram este post) pensados em torno da figura de gregor samsa, a magnífica personagem do livro metamorfose, de Franz Kafka. A recepção teve início às 16h00, mas prolongar-se-á até às 20h00. Eu vou tentar passar por lá. Quem puder, não perca a oportunidade de partilhar este momento com o artista. A mostra estará patente até 14 de Dezembro.

Sobre valter hugo mãe
site
Casa de Osso (blog individual)
Da Literatura (blog colectivo) Objecto Cardíaco (editora)
Blog da Objecto Cardíaco (editora)

Galeria Símbolo (site oficial)
Rua Miguel Bombarda, n.º 451
4050-378 Porto
Tel. (+351) 226099349
Aberta de segunda-feira a sábado, das 15h00 às 19h00.

quarta-feira, 1 de novembro de 2006

«A paciência é uma virtude, Mente.» 

Assumo (o nome deste blog é Assumidamente por algum motivo, não?): eu cá já não tenho pachorra para os pseudo grandes debates da nação que o programa Prós & Contras da RTP1 se arroga fazer. Explico porquê.
Tomemos como exemplo o último programa. O tema do debate foi o referendo sobre o aborto. Vamos lá ver por pontos por que é que eu me irrito com aquilo logo no início.
1. Vejamos os convidados: deputados e médicos. Acaso se trata de uma questão unicamente política e de saúde? Onde estão os juristas, os sociólogos e os historiadores, só para fazer referência às áreas que mais gritantemente, na minha modestíssima opinião, deveriam estar presentes nestas conversas? E já agora, por que é que nestes debates quase nunca se fala das experiências de outros países? Um povo como o português, que tanto gosta de sondagens, também haveria de gostar, de vez em quando, de um estudozinho comparado, minha gente! Mas não. Disso não se ocupa o Prós & Contras. Se os estudos fossem feitos por alguma empresa ligada a um secretário de Estado, ainda vá que não vá, mas se não forem, que raio de interesse é que podem ter?! É que nem para notícia dão...

Já sei o que estão a pensar. Eu sei que ainda agora comecei a escrever e já estou a ser irónica. Eu bem que tento, palavra de honra, mas não consigo resistir à ironia. A falta de paciência leva-me a isso. Pensar que à segunda-feira à noite se fazem no Prós & Contras os grandes debates da nação deixa-me assim: irónica. Adiante.

2. A Fátima Campos Ferreira até nem é má rapariga, mas vê-la naquele papel já me dá náuseas. Sou exigente, bolas. Para mim é preciso mais do que dez frases decoradas e um gesto de mãos recorrente para conduzir um debate. É preciso dominar as matérias, é preciso poder de condução, é preciso carisma, é preciso saber fazer o papel de advogada do diabo, coisa que a angelical Fátima (não sei se perceberam o trocadilho com o angelical e o Fátima) não faz. Às vezes dou por ela a acenar que sim com a cabeça quando o convidado x ou y está a dizer qualquer coisa. E aqui peço licença para uma breve interrupção para deixar umas palavrinhas à senhora.

Querida Fatinha: assim não. Permita-me umas sugestões. Veja a Maria Flor Pedroso ao domingo à noite a dar que fazer ao Professor Marcelo. Veja e aprenda como se faz. Veja como ela acena que sim com a cabeça ao que ele diz e quando ele conclui remata com uma frase a contrariar o que o homem acabou de dizer. Conte o número de vezes que o Professor Marcelo diz "pois" e "vamos ver" depois de a Maria Flor Pedroso rematar o comentário dele... Perceba como o homem fica com a noção de que tudo o que ele diga poderá ser rebatido por ela e como isso o obriga a fundamentar bem o que diz e a pensar as palavrinhas todas. Perceba como ele se dá conta de que a interlocutora dele tem miolos. Veja, conte, examine e aprenda. Vai ver que só lhe fará bem. E já agora, repare bem na postura da Maria Flor Pedroso. Já viu que ela não tem nenhum tique nem com as mãos, nem de mexer no cabelo, nem expressivo? É que ela impõe respeito só pelo modo como olha para o Professor Marcelo. Até ele, quando fala, mal consegue tirar os olhos dela... Bem, nesse aspecto não o censuro... ;)

Onde é que eu ia que já me perdi? Ah! Já me lembro. Ia falar das vitórias e das derrotas!

3. Ponto assente: por princípio, sou contra esta mentalidadezinha do debate que existe em Portugal. As pessoas vêem os debates não para assistir a um confronto de ideias e daí tirar uma súmula que seja profícua, não. Desenganemo-nos: para a malta cá do burgo – e nisto a comunicação social dita modas e lança tendências - , o que interessa saber em relação a um debate é quem ganhou. Sim, porque os debates ganham-se ou perdem-se, não sabiam? É verdade! É assim uma espécie de "guerra" para a qual as pessoas vão abastecidas de "munições" (as palavras, que não importa que sejam coerentes, importa é sejam em maior número que as do oponente) e onde tentam "matar" o "adversário" (ou seja, o tipo que tem o atrevimento de ter uma opinião contrária!). Ninguém faz debates para aprender, nem para reflectir, nem para amadurecer ideias nem para confrontar opiniões e daí tirar a melhor solução. Nada disso! Os debates em Portugal servem para ver quem é aquele que, logo à partida, tem as "armas" (os argumentos, dizem eles) mais fortes. Ou seja, aquele que no final tiver ganho, é aquele que já antes do debate tinha razão! Os debates são, assim, uma espécie de consagração. O vencedor é o tipo esperto, o gajo que afinal tinha razão, o gajo que sempre teve razão! Aliás, se não fosse para essa consagração, os debates nem eram necessários! Afinal, as opiniões não se formam após os debates, meus amigos! As opiniões são anteriores aos debates! Os debates não servem para informar, servem para consagrar! Por isso é que não interessa nada saber o que aconteceu nos outros países! Interessa é saber, dos portugueses que lá estão a debater, quem é o mais Chico-Esperto!

Por isso é que eu já não tenho pachorra para os debates. Se calhar o mal está no facto de já ter assistido a muitos. É que eu tive durante muito tempo o hábito de ver debates para apontar as asneiradas que as pessoas iam dizendo. Gostava especialmente daqueles entre o José Sócrates e o Pedro Santana Lopes no Jornal de Domingo da RTP1. Esses eram um fartote de rir! Quando se falava de aspectos jurídicos, os comentários do Sócrates eram um prato cheio! Já o Santana metia a pata na poça assunto sim, assunto não!
Agora os debates deprimem-me, caramba! Deprimem-me mesmo! Estão a ficar muito portuguesinhos, os debates em Portugal (olha, mais um trocadilho)! Os convidados não vão lá para esclarecer quem os está a ver, vão lá para medirem as pilinhas, perdoe-se-me a expressão. De tal modo que vale tudo, até contradizerem-se a si próprios, desde que isso achincalhe a participação do outro. Eu dou um exemplo partindo, novamente, do programa de ontem.
Decerto todos ouvimos a Edite Estrela dizer ontem que, caso a lei seja alterada de acordo com o que é proposto no referendo, uma mulher que interrompa voluntariamente a gravidez às onze semanas terá de responder por isso em tribunal porque «as leis são para cumprir» (palavrinhas da própria). Sim, quem disse isto foi a mesma Edite Estrela que afirmou, como todos bem se lembram, a propósito de julgamentos já realizados, que nenhuma mulher deveria ser punida por ter feito um aborto. Estão a ver como a senhora é profundamente coerente, não estão? Já agora, se me é permitido, mais uma interrupção para dirigir umas palavrinhas à Edite Estrela...

Ó senhora deputada, se não fosse pedir muito, já que a senhora é deputada do partido do governo, será que poderia explicar-me três aspectos que me intrigam na pergunta do referendo? São os seguintes:
1. Admitir que a decisão da realização do aborto dependa de uma decisão unilateral da mulher não é descuidar a posição do homem e, portanto, consagrar na lei uma flagrante violação do princípio da igualdade? O que é que lhe diz a sua sensibilidade jurídica sobre isto?
2. O que determinou a escolha do prazo das dez semanas para delimitar o aborto legal do aborto ilegal, visto que nenhuma alteração significativa se verifica na vida do feto entre as dez e as onze semanas, por exemplo? Porquê dez, é por ser um número mais redondo, é? Ou é por ser o número da camisola do Rui Costa na Selecção (prima aNa, é o 10, não é?)?
3. Na lógica desta proposta, a mulher que aborte até às dez semanas em estabelecimento legalmente autorizado não comete um crime, enquanto que a que aborte em estabelecimento não autorizado já o comete. Assim, pergunto: o que distingue, neste caso, a conduta criminosa da não criminosa é o local onde o aborto é realizado? Ora bolas, senhora deputada, eu que pensava que o que qualificava uma conduta como crime era o facto de violar um bem jurídico fundamental para a comunidade, fico na dúvida se tudo não se resumirá a circunstancialismos de lugar... Milhares e milhares de páginas de doutrina geral do crime que me enganaram! Aquele malvado ignorante do Roxin...

E já chega de diálogo com a senhora deputada que nem sequer me vai responder. Até porque desconfio que mesmo que eu estivesse frente-a-frente com ela não me responderia, mas é só uma desconfiança minha... Isto era só mesmo para demonstrar algumas incoerências flagrantes que, aparentemente, não preocuparam muito os participantes do debate que se batiam pelo «sim». Mas porque este post não tem como objectivo dissertar acerca das coisas que me intrigam na proposta de alteração da lei, fico-me por estas palavras que servem apenas para demonstrar que não importa a contradição, importa é ganhar o debate!

E no dia seguinte, a que se assiste? De que se fala à terça-feira? A comunicação social, os bloggers e o Zé e o Joaquim enquanto tomam a bica ao balcão discutem entre si quem saiu vitorioso no Prós & Contras da noite anterior. E a desgraçada da Fátima Campos Ferreira dá por si com um novo dilema para resolver: que fatiota usar no programa da próxima semana?!

Pronto, basta de ironia e de dar tau-tau nos debates do Prós & Contras. Termino como comecei, assumindo. Assumo que desliguei o televisor insatisfeita e cada vez mais convencida de que (e estou a ver que isto tende a piorar com o avançar da idade), não tenho mesmo nenhuma réstia de pachorra, nem com carradas de ironia, para debates de pequeninos vencedores e vencidos. Não deve faltar muito para nem sequer ligar o aparelho à segunda-feira à noite. E chego à conclusão que com intervenções de certo calibre e debates neste formato, ficamos todos, lamentavelmente, a perder.

Somos altos, baixos, magros, gordinhos, extrovertidos, introvertidos, religiosos, ateus, conservadores, liberais, ricos, pobres, famosos, comuns, brancos, negros... Só uma diferença : amamos pessoas do mesmo sexo. Campanha Digital contra o Preconceito a Lésbicas, Gays, Bissexuais e Transgéneros. O Respeito ao Próximo em Primeiro Lugar. Copyright: v.


      
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