sábado, 12 de fevereiro de 2005
Not in my name.
Considero este tipo de apelos vindos das associações de defesa dos direitos lgbt, como se intitulam, um péssimo exemplo. O cartaz apela ao não-voto na direita, o que é dizer que apela ao voto na esquerda. A única razão que invoca para tal é o facto de a esquerda, pretensamente, defender os direitos dos lgbt. Ora, a questão de saber se o faz bem ou mal, por si só, daria azo a uma interessante troca de ideias e argumentos, mas não é sobre isso que este post versa.
Pessoalmente, não vou neste tipo de mobilização e por um motivo muito simples: o voto, julgo, não deve estar condicionado pela orientação sexual do eleitor. Ao ver apelos deste tipo, assaltam-me algumas dúvidas...
1. Será que eu, enquanto lésbica, não tenho toda a legitimidade para votar na direita ou na esquerda, consoante achar melhor, de acordo com todos os requisitos que considero válidos para o meu voto?
2. Será que eu, por ser lésbica, tenho menos direito a votar na direita do que qualquer heterossexual?
3. Será que não tenho o direito de escolher em quem quero votar como qualquer outra pessoa e devo apenas votar naqueles que defendem os direitos dos homossexuais?
E por aí fora...
Em suma, o que aqui está em discussão é isto: a orientação sexual de cada homossexual deve transformar-se no critério fundamental de escolha na hora de votar?
Perguntou-me @ Manel da Truta se eu tinha conhecimento de algum partido de direita que defenda os direitos dos homossexuais. Ora, todos sabemos que a resposta é não*. Mas também não é verdade que a esquerda os defenda. Basta ver, por exemplo, que partidos como o PCP ou o PS não o fazem: o primeiro nem se refere à questão, o segundo não faz qualquer tipo de proposta no sentido, sequer, de trazer a questão para o debate social.
Assim sendo, resta o Bloco de Esquerda. Ora, se assim é, é fácil concluir que esta campanha das Panteras Rosa tem um objectivo muito específico: apelar ao voto no partido que defende os direitos dos lgbt, ou seja, o BE.
E era aqui que eu pretendia chegar. Porque isto é, nada mais, nada menos, do que a partidarização do movimento lgbt. Isto é tudo o que o movimento lgbt não precisa. E é bom de ver porquê: é preciso separar as águas. Todos os lgbt perdem sempre que são conotados com isto ou com aquilo.
Há dias, o Miguel dizia, em jeito de desabafo, que «nunca será demais dizer que o facto de o BE ser o único partido, por enquanto, a ter um grupo LGBT, deve ser razão de orgulho moderado. Porquê? Porque é necessário que outras áreas ideológicas e de sensibilidade política e partidária se debrucem sobre o tema. Não é saudável para ninguém que só um partido o faça.»
Concordo em absoluto com ele. Não é saudável, para usar a expressão do Miguel, que os lgbt sejam politicamente conotados com um partido. Se esta situação serve os interesses de alguém, presentemente, servirá apenas os interesses do BE, mas não os dos lgbt. Isto não significa que eu não me congratule com as posições do BE, que não ache louvável que ao menos esse partido traga a discussão para a sociedade. Considero muito boa a acção do BE nesse aspecto.
O que eu não considero louvável é que as associações lgbt se conotem com um partido, porque os direitos dos lgbt não são uma discussão política, são uma discussão social. Porque esses direitos, para que nos sejam reconhecidos, não podem depender da vontade política, porque não é aos políticos que cabe decidir sobre os direitos que os seres humanos têm enquanto seres humanos, como o direito à igualdade e o direito a casar e constituir família. Esses direitos existem e ponto final. Se assim é, quem tem de permitir que esses direitos sejam uma realidade é a sociedade, porque de nada vale uma lei feita com vontade política que não é posta em prática pela sociedade: é mera law in books, jamais law in action! Os direitos dos lgbt não podem ficar apenas no papel, têm de sair cá para fora!Acaso isto se consegue com a conotação desta luta a um partido? Penso que não, porque para mim isto só se consegue mobilizando a sociedade civil, onde há muitos partidos, ou melhor, muitos militantes de muitos partidos.
A meu ver, o movimento lgbt deverá, tanto quanto possível, manter-se apartidário. Mas apartidário não quer dizer apolítico. Sou totalmente a favor da constituição de "grupos de pressão política" nas associações de defesa dos direitos dos lgbt, desde que esses grupos de pressão actuem em todos os quadrantes, junto de todos os partidos. Com o que eu não posso concordar, jamais, é com a partidarização da causa lgbt, que conduzirá, necessariamente, à guetização e à conotação negativa.
Eis os motivos pelos quais não posso concordar com apelos como o das Panteras Rosa: porque eles aparentemente defendem os direitos dos lgbt, mas no fundo minam o trabalho de todos os que pretendem construir uma sociedade plural e igualitária.
Espero, com isto, ter clarificado a minha posição quanto a este assunto. E espero que @ Manel tenha compreendido o meu ponto de vista. Isto, claro, se teve paciência para me ler... ;)
* Pelo menos, abertamente. (1) Mas não esqueçamos que a inclusão da expressão "orientação sexual" no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa ocorreu numa legislatura com um governo de coligação PPD-PSD/CDS-PP, cujo Primeiro-Ministro era Durão Barroso, presidente do PSD.(2) E é igualmente do conhecimento público que o Ministro da Justiça, José Pedro Aguiar-Branco, que é também do PSD, se preparava para finalmente alterar o artigo 175.º do Código Penal, que é altamente discriminatório da homossexualidade, ao prever um tipo de crime específico para a prática de actos de natureza homossexual com adolescente. Esta alteração não veio a verificar-se em consequência da dissolução da Assembleia da República. (3) Merece também menção a intenção do PSD de regular o regime das uniões de facto, no sentido de conceder às pessoas nestas situações direitos sucessórios como sucede nos casamentos.
Embora não possa falar-se em apoio explícito dos partidos de direita aos lgbt, não poderá negar-se que o PSD é um partido sensibilizado para o tema, tendo já tomado medidas para alterar o cenário.
depositada, avaliada e analisada no artigo intitulado: "Not in my name". Tive a paciência de ler com bastante atenção a abordagem tecida em torno do tema dos direitos dos homossexuais no seio da circunstacialidade política. Com efeito, agradeço à autora deste texto de cariz bastante emblemático a transmissão da sua posição face à frase de afirmação do grupo panteras rosas perante a campanha do partido de direita. Desejo, no entanto, acrescentar, visto este site ser um espaço dedicado à liberdade fundamentada de ideias, a minha verdade perante a leitura que realizei. Dirijo-me, a si, compositora do texto, quando refere que a publicidade projectada defende a teoria de que a opção sexual bloqueia a capacidade racional de sufrágio universal promulgada pela Constituição da República Portuguesa e que não devem ser os representantes políticos os principais agentes defensores dos direitos das ditas minorias. Devo dizer que discordo plenamente da sua concepção. De seguida apresento a legitimação da minha discórdia. O pensamento veiculado pelo reclamo publicitário dos panteras rosas não advoga a dessacralização do poder de voto gay, nem daqui se infere que os gays ou lésbicas e demais sejam portadores de uma deficiência intelectual por assumirem um identidade diferente da existente, apenas apresentam a diferença no interior da igualdade por intermédio de palavras verdadeiras que procuram promover o espaço de liberdade política entre todos e não só para um todo. Em segundo lugar, sou apologista da ideia de que a democracia (palavra grega que deriva da justaposição de dois termos "demo" povo e "cratos" poder ) poder do povo, para o povo e pelo povo, que se estrutura pela eleição de representantes políticos que manifestam um conjunto de valores promovendo o bem estar social e individual, deve vigorar. O estabelecimento e aplicação das leis não deve ser utópico mas sim ser impregnado de pragmatismo, colmatando dentro do máximo possível as necessidades e falhas de uma realidade humana em constante desenvolvimento e aperfeiçoamento. Daqui se depreende que a regência de um governo, progride na dialéctica governadores e governados, caracterizada sempre por princípios de autenticidade e honestidade de vectores e directivas políticas. Obviamente que o que hoje assistimos em termos reais contradiz o que acabei de escrever. Não obstante, não encontro outro mecanismo de defesa das minorias dentro de maiorias (mesmo num regime democrático)a não ser o de agentes políticos ou entidades partidárias, dirigentes que possam expressar a vontade do cidadão português e estrangeiro também. Concordo que as coligações gays ajudam bastante a vencer certas barreiras, mas não pode o cidadão comum e normal despender de mecanismos por si próprio com vista a reestruturar a mente daqueles que não são ensinados a ser tolerantes e respeitadores da diferença. Não somos a personagem "neo" do filme matrix possuindo poderes de mudar a sociedade. Tem que existir força mental e física, só ela possível pela representação de pessoas que manifestem e continuem a lutar pelo bem geral e coesão social independentemente das escolhas sexuais que tomamos.
Agradeço, todavia, a possibilidade de dialogar ideias consigo, apesar de colocadas em pontos de vistas diferentes. Até breve...
Marriage is love. |