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quarta-feira, 3 de setembro de 2003

Um post assumidamente polémico! 


Não sei se por deficiência de carácter ou se por qualquer patologia até hoje nunca despistada, a verdade é que sempre optei por me demarcar de todo o tipo de manifestações que envolvessem saídas à rua, cartazes ou gritos de guerra.

Foi assim desde os tempos de liceu, quando observava de fora as memoráveis (por favor digam-me que se recordam para que eu não me sinta jurássica!) lutas contra as PGA's ou contra as Provas Globais. Na altura faziam-se cartazes onde, em letras garrafais podíamos observar rimas livres com o nome pouco feliz do então Ministro Couto dos Santos, rapidamente substituído pela não menos "sugestiva" (salvo seja!) Manuela Ferreira Leite!
Foi assim também mais tarde, quando os livros de liceu foram substituídos pelas sebentas da Faculdade e aos gritos esporádicos contra os exames se sobrepuseram os gritos mais prolongados da luta contra as propinas. Aí, na Academia mais antiga do país, apercebi-me como falhava em mim o elo que me ligaria ao sentido de qualquer tipo de greve ou manifestação. Não fui nos autocarros para Lisboa gritar aos ouvidos de um Ministro que não ouvia, não encerrei a cadeado portas que só a nós, alunos, nos interessava que abrissem, não me inflamei com o fogo das frases de ordem que rasgavam aquelas noites de Assembleias Magnas... Não o fiz e (mea culpa, talvez!), ainda que apelando a toda a tolerância que acredito dever existir perante todos os comportamentos humanos, também não compreendia quem o fazia!

Foi assim desde sempre... E é também assim hoje quando a palavra "Pride" me traz à imagem um grupo de LGBT's desfilando pelas ruas com bandeiras de várias cores, rumo a um destino que tod@s bem sabemos qual é, mas a que nunca chegaremos se nos limitarmos a gritar palavras de ordem para os ouvidos amorfos da "sociedade"!... É, ainda, assim quando em nome desse tal "Orgulho" se organizam festas em que a única diferença face às greves universitárias é que, como ferrolhos, em vez de serem utilizados os cadeados de então são utilizadas as portas do bar eleito para o evento - quase sempre o mesmo!... Não caminho!... Não participo!...

No entanto, não o faço por desleixo, por falta de sentido de "cidadania" (digamos assim) ou por comodismo. Faço-o por convicção... ou melhor, por um conjunto de convicções que, ainda que reconheça serem polémicas, são as minhas e são aquelas em que assumidamente (já cá faltava, não era?) acredito:

1. Faço-o, primeiro e acima de tudo, porque não acredito que os desfiles pelas ruas das cidades, os cartazes com o fundo em arco-íris ou os slogans que, por um dia, invadem as ruas possam mudar alguma coisa!
A mudança de que tod@s precisamos é uma mudança de mentalidades que só o tempo e a acção diária de cada uma de nós, nos nossos locais de trabalho, nas nossas famílias ou nos nossos grupos de amigos poderão conseguir. Precisamos, acima de tudo, de provar a este mundo, ainda tão inóspito, que ser-se "gay" ou "lésbica" não significa ser-se "bicha" ou "fufa", "panão" ou "camionista" (estas duas então são do pior!); significa simplesmente que o complemento que procede palavras como "desejo-te" ou "amo-te" tem um género diferente daquele que foi estipulado como normal pela sociedade (ei-la de novo!) e que isso não diminui um milímetro a nossa dignidade, probidade e rectidão enquanto seres humanos! Precisamos, acima de tudo, de provar e demonstrar que nenhuma relação existe entre o género da pessoa que amamos e o grau de respeitabilidade a que temos direito.
Consegui-lo-emos envergando num dia de fins de Junho uma bandeira colorida? Ou organizando "festas temáticas" onde os curiosos são mais do que os visados? Contribuirão tais desfiles ou organizações para a promoção da nossa imagem junto da opinião pública?
Se sim, expliquem-me em quê, que eu não consigo ver como.

2. Faço-o também porque desde sempre recusei que as minorias, fossem elas quais fossem, se vissem irradicadas para guetos mais ou menos sofisticados, mais ou menos disfarçados... mas sempre segregacionistas, como nenhum gueto poderia deixar de ser!
Confesso-vos: sempre que vejo um cartaz a promover uma festa gay, como a "Pride" que a Mente Assumida descreveu num post anterior, nasce em mim uma dupla sensação de desconforto: primeiro porque esta bandeira às cores içada nas portas ou convites dos bares me traz reminiscências da judaica Estrela de David, como se sempre que um grupo de lgbt's se encontra seja necessário prevenir os mais incautos de que "eles andem aí!"; segundo, porque ao ouvir anunciar tais festas não consigo evitar aquela sensação de que faltou apenas dizer que havia ali mão de Victor Hugo Cardinalli, uma vez que é inegável o facto de que, em qualquer festa gay, a maior parte do público são heteros curiosos por ver "essas espécies raras" (mas não em vias de extinção!) que são os homossexuais!
Mais uma vez pergunto-me... pergunto-vos: num momento delicado da nossa história, em que já é impossível negar a nossa existência, até que ponto será benéfico expormo-nos desta maneira? Até que ponto desejamos fazer passar a imagem de que somos apenas um grupo de foliões que gosta de excentricidades, de se mostrar e de chocar mentalidades?... Acreditem que quem o diz não sou eu (obviamente!)... nem sequer é uma minoria.

3. Haveria mais três, quatro, cinco... imensas razões que poderia aqui invocar para me pronunciar contra as "Prides" nos moldes em que têm sido feitas. No entanto, como este post já vai longo, tais devaneios ficarão para uma próxima oportunidade.

Não posso, todavia, deixar de fazer aqui algumas ressalvas!
O que aqui vai dito não é, de forma alguma uma manifestação anti-cultura lgbt. Pelo contrário, defendo que a promovam, muito e de várias formas! Autores escrevam livros! Guionistas, escrevam novelas! Músicos, cantem a nossa forma de amar! A nossa cultura é um trunfo que temos que acarinhar com todo o empenho... Quanto mais não seja para demonstrar o quão diversa ela é, reflexo, sem dúvida, da igual diversidade e variedade de pessoas que constituem a nossa comunidade!
Não estou também aqui a colocar em causa o trabalho, cujo mérito não só reconheço como agradeço, das Associações Homossexuais nacionais e internacionais, que só pecam pela pouca visibilidade mediática (de que obviamente não são responsáveis) dos seus eventos e iniciativas...

O que apenas hoje aqui me apeteceu dizer foi que se queremos, algum dia, poder gritar na rua, ou nos bares, ou em qualquer outro sítio, que nos sentimos orgulhosos de alguma coisa, que o façamos pela alegria de termos conseguido provar que, apesar de toda a discriminação que há séculos vimos sofrendo, finalmente conseguimos demonstrar que não queremos chocar nem provocar ninguém, apenas queremos poder viver a nossa vida com a dignidade e o respeito a que a nossa condição de seres humanos nos dá direito... Aí sim, orgulhosa e assumidamente!


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