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sábado, 24 de setembro de 2005

Na volta do correio. 

Não é matemático... nunca é matemático!...
...
E, de repente, vêm-me à memória todos os professores de matemática e de ciências que me passaram pela vida, todos a incitar-me a seguir uma vida de números ou de ciências: «porque tens queda», «porque tens mais saídas», «porque terás garantidamente um melhor futuro...» «porque...» «porque...» «porque...»
... E eu queria lá ouvir «porque sim» quando sabia perfeitamente «porque não»: porque não tinha piadinha absolutamente nenhuma, porque "dois vezes dois" seriam sempre "quatro", por muitos x e y e z e logaritmos e equações e todos os alfabetos gregos que nos metessem no caminho, porque, no fim, "dois vezes dois" seriam sempre "quatro", sem surpresas, sem desafios, sem aventuras.
Afinal, porque haveria de ser sim, quando o que realmente me fascinava no ser humano era tudo aquilo que as fórmulas matemáticas deixavam por explicar? Tudo aquilo que saltava da ponta do bisturi?
Disse então o primeiro "Não!" convicto a todos aqueles que me rodeavam e segui o caminho muito mais inseguro, muito mais pantanoso, muito mais sabes-lá-o-que-te-espera, muito mais se-isto-dá-para-o-torto-ainda-vais-ter-que-levar-com-eles-todos-em-cima... mas também muito mais fascinante, muito mais apaixonante, muito mais realizador, muito mais enriquecedor, muito mais... humano, das "humanidades", a constatar sempre e cada vez mais que...

... Não é matemático... nunca é matemático!...
♥≠123
Não é matemático o ser humano, não são matemáticos os sentimentos, não são matemáticas as emoções... como haveríamos de querer que fossem matemáticas as relações?! Como haveríamos de ambicionar que, de repente, de um dia para o outro, o Joaquim e a Maria se conhecessem, se apaixonassem e "um mais um" passassem a ser "dois" e pronto, ponto final, estava resolvida para toda eternidade a fórmula-amor-da-vida, siga a correr para a fórmula seguinte em que aos dois da fórmula anterior se soma o um ou três ou onze(!!!) da fórmula-filhos para se chegar à fórmula-família-feliz (também conhecida como fórmula 53 dos restaurantes chineses), sem nunca mais se questionar a fórmula inicial?
É muito mais complicado do que isso... muito mais rebuscado... muito menos... (vá, adivinhem lá a palavra que eu vou dizer a seguir... ãh?... disseram qualquer coisa acabado em –‘ado, para rimar com "complicado" e "rebuscado"? Pois então enganaram-se! O que eu ia dizer era uma palavra totalmente nova: muito menos...) ... matemático!!!

E é complicado e rebuscado e nada matemático porque hoje a Maria conhece o Joaquim e gosta tanto dele e está tão bem à beira dele, e é tão feliz quando se ri com ele, e ele percebe-a tanto e tão bem, que ela fica tão convencida que é com ele que o "um mais um" vai dar "dois", que até se esquece, por momentos, do bem que se sentia com a Luísa, ou então ainda se lembra mas fica plenamente convencida que o que aconteceu com a Luísa foi uma confusão e que afinal a Luísa pertencia era à fórmula dos amigos e ela a somou na coluna errada... Então toca a corrigir o erro, a acrescentar a Luísa à fórmula correcta e a vestir o vestido branco, a atirar o ramo, a dizer «que sim que sim, para sempre sim senhor e amar e respeitar também, sim senhor, senhor Padre, que a Igreja hoje ainda está mais bonita do que da última vez que cá vim, quando fiz o Crisma»... e lá fica a fórmula perfeita...
... Mas depois a Maria está com o Joaquim, a acreditar muito que a fórmula está perfeita, e até já está a pensar em passar para a coluna dos filhos, para chegar à coluna do 53 dos chineses, e, de repente, reencontra a Luísa e, "Ai Jesus!", que o calor que ela sente só de ver a Luísa outra vez faz dilatar tanto, tanto a coluna da amizade que aquele "um" quer saltar outra vez para a fórmula-amor-da-vida e, de repente, o "um" do Joaquim foi passear até à fórmula da coluna da amizade... e, porque é certo e sabido que os amigos não se magoam, o que vai fazer a Maria, que ama tanto a Luísa, mas que ama tanto também o amigo Joaquim, que os amigos também se amam, ah pois amam! E magoá-los a eles é como magoarmo-nos a nós, ah pois é!... Aliás, antes magoarem-me a mim do que magoarem os meus amigos!... «E, olha que boa ideia! E se em vez de magoar o Joaquim me magoasse antes a mim, e ficasse com ele, e esquecesse a Luísa e pronto? Como é que não me lembrei disto antes?!... Não me lembrei disto antes porque também há a Luísa... e amo a Luísa, que caraças! E ela ama-me a mim... e não há como fugir», toca a re-corrigir o erro: o "um" do Joaquim para a fórmula dos amigos, o "um" da Luísa para a fórmula do amor-da-vida... E fica a fórmula-amor-da-vida do Joaquim incompleta, destroçada, vazia, desiquilibrada, despedaçada... e tudo... e tanto, que ele deixa de poder ver a Maria e foge-lhe da fórmula da amizade, que não é ali que quer estar... e fica a Maria também com as contas trocadas e incompletas e destroçadas e vazias e...

... e depois há as outras quinhentas fórmulas de que poderia falar:
- a fórmula da Maria que conheceu o Joaquim e viveu sempre a vida toda com ele, sem Luísa nenhuma de ante-mão, já com filhos e família feliz e tudo... e, de repente, cai-lhe uma Luísa na vida, vinda literalmente do céu, e a Maria descobre que, a partir daquele momento da sua vida, já não faz sentido viver com o Joaquim, que o Joaquim foi o homem da vida dela até então, e que foi tudo muito bom e muito feliz e muito perfeito, mas que a partir dali só faz sentido com a Luísa – e toca de subtrair e distribuir tudo de novo...;
- a fórmula da Maria que sempre gostou de Luísas, Isabéis, Antónias e Joaquinas, mas que, quando conheceu o Joaquim sentiu que era com ele que seria feliz, e toca de esquecer as Luísas, as Isabéis, as Antónias e as Joaquinas e ficar com o Joaquim... talvez até sempre... talvez até aparecer uma nova Luísa... ou, porque não, um outro Joaquim?!...
- etc., etc., etc...

Enfim, poderia descrever aqui uma infinidade de fórmulas, tantas quanto o número de seres humanos à face da Terra, tudo para constatar uma só e simples verdade: não há matemática nas relações humanas! Não se podem fazer demonstrações, nem cálculos, nem estatísticas, nem previsões! Nada é tão pão-pão-queijo-queijo como "sou-lésbica-mas-ando-com-um-homem-só-para-disfarçar, só para manter a fachada, só para enganar". Há sempre milhentas variantes nesta fórmula que não podemos deixar de considerar: há a variante "fui lésbica mas agora gosto dele", a variante "não sou lésbica, só gostei dela, mas agora gosto é deste", a variante "juro que era hetero quando me casei, mas esta mulher tira-me do sério", a variante "sim sou lésbica, não não gostava dele quando me casei, mas decidi abdicar da minha felicidade em troca de uma família e de paz social, e sempre me esforcei para que o casamento desse certo"... E tantas, tantas outras variantes!... Já para não falar naquelas variantes que levam agarradas a si o peso da desonestidade, da mentira e da traição...

Mas, e quando acontece? E quando as variantes ficam todas descobertas? E quando o Joaquim se depara finalmente com a Luísa da vida da sua Maria? E quando a matemática se nos cai toda em pó aos pés e parte chão, com tijoleira escolhida em conjunto dias antes do casamento e tudo, e nos faz desabar o Mundo?... Então... Olhem, então, é o caraças!... Mas é o caraças quer seja uma Luísa, quer seja um João, quer seja uma Maria João! É sempre o caraças!... E, então, aí, o mais sensato é fazer mesmo como a Tangas sugere e "tomar uns valentes copos, pôr a música de dor de corno em altos gritos e desmoncarmo-nos a chorar nos braços da vizinha quando ela nos bater à porta a protestar"...

Tão só e simplesmente isso! Não vale a pena perguntar porque é que é uma Luísa em vez de um Luís, uma Joana em vez de um João... Não interessa!... Interessa só pegar no Betadine todo que houver pela vida, com amigos, livros, cinema e jogos de futebol incluídos, e cicatrizar as feridas... Pensar nas mentiras? Nas traições? Nos enganos? Tentar perceber as razões que conduziram à homo/hetero/bi/qualquer-outro-sufixo-que-se-goste-de-inventar – sexualidade da pessoa que se amava? O Joaquim tentar perceber o que passava na cabeça da Maria quando estava com ele, se do que ela gostava mesmo era de mulheres, e matutar nisso, e sofrer enquanto pensa nisso, enquanto tenta descobri-lo de mil e quinhentas formas? Tudo isso de nada vale! Tudo isso, tenho cá para mim, é tão inútil quanto é inútil tentar encontrar o amor através de electrocardiogramas... tão inútil quanto é inútil tentar alcançar o impossível... e impossível, porque simplesmente (vá, todos comigo!) não é matemático! Não se explicará nunca através de fórmulas lógicas e eternamente válidas!

... E com isto tudo, estou quase tentada a criar uma fórmula muito simples: ♥≠123 e declará-la a fórmula universal das relações humanas! Uma fórmula que serve para explicar que não vale a pena procurar respostas e razões lógicas para os fins das relações, mas uma fórmula que vigora também no princípio e durante qualquer relação entre seres humanos: porque nenhuma (nenhuma, leram bem) relação humana tem a eternidade garantida; porque o "um mais um" de hoje pode ser sempre subtraído multiplicado ou dividido amanhã, devido a uma quantidade insondável e muito pouco matemática de factores... e é verdade que isso é assustador, e nos faz bater o coração mais depressa na ansiedade de ai-meu-deus-a-nós-não-nos-vai-acontecer-e-vamos-ficar-juntas-o-resto-da-vida-que-estupidez-o-que-ela-está-para-aqui-a-dizer... mas também é isso que torna as relações humanas especiais, fascinantes e desafiantes, porque é isso que nos obriga a, diariamente, regar e solidificar cada uma das somas e multiplicações de que depende a nossa felicidade... sempre na esperança de que, assim, possam sobreviver às subtracções e divisões, que mais cedo ou mais tarde, nos poderão surpreender e, para as quais teremos que estar sempre preparados, porque afinal...

... Não é matemático... nunca é matemático...

... E, por ironia, regresso aos meus professores de matemática, para constatar que vim dar à mais matemática das "ciências sociais"... por ironia, especializada, numa das mais matemáticas das suas áreas... Enfim, ironias da vida, a demonstrar-nos que o que nós queríamos, mesmo, é que tudo pudesse ser sempre matemático... ou que, se não sempre, pelo menos que houvesse uma ou duas situações na nossa vida em que, garantidamente, "dois vezes dois" fossem sempre e para sempre "quatro"!


Comentários:
É assim, os próprios sentimentos são confusos e muitas vezes nada os pode tornar claros!Resta saber se só de sentimentos se constroiem boas relações. Se queremos não relações sólidas mas intensidades de sentir.
 
Manhã, sinceramente, estou em crer que a resposta é: sim, só de sentimentos se constroem boas relações... aliás, só de bons sentimentos se constroem boas relações... ou mesmo boas intensidades de sentir!
Mas, lá está, esta é a minha forma de sentir, ou melhor, tem sentido a minha forma de sentir... e só isso, sem fórmulas!
 
You need a better translator; check out the Babel Fish one on my blog, it works better. :-)
 
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