domingo, 29 de agosto de 2004
Está no ar a Telenovela! (II)
O barco em questão é propriedade da Women on Waves, uma associação holandesa que tem quatro níveis de intervenção: Fortalecimento, Prevenção, Segurança, Liberalização. A ideia deste barco é percorrer as águas até atracar em portos de países onde nada disto acontece. Em Portugal, por exemplo, em termos sociais, a questão é cada mais questionável, de prevenção não poderá falar-se com propriedade, a segurança, no que diz respeito ao aborto, não existe, e a liberalização está longe de acontecer enquanto a prática for ilegal.
E o que, decerto, neste momento mais estará a irritar "o licenciado em Direito que queria que fosse inventado um novo crime para punir quem pinta grafitties nas paredes, porque ainda não sabia que o crime de dano existia", licenciado esse mais conhecido por Paulo Portas ou "o Ministro da Defesa que nunca foi à tropa", é que tudo isto é feito sempre de forma absolutamente legal. O procedimento é este: caso o aborto seja ilegal no país de origem da mulher, como acontece em Portugal, a tomada da pílula abortiva é feita dentro do navio mas em águas internacionais. Ora, em águas internacionais, a legislação aplicável a tudo o que seja feito dentro do navio é a do seu pavilhão. Neste caso, uma vez que o pavilhão deste barco é holandês, aplica-se a lei holandesa a todos os actos levados a cabo em águas internacionais, mas só em águas internacionais, porque se a embarcação estiver, por exemplo, nas nossas 12 milhas, aplica-se a legislação portuguesa. Ou seja, recorrendo a uma imagem, para lá das 12 milhas e sempre que se esteja em águas internacinais (isto é, que não pertençam a nenhum país), este barco é um pedaço de Holanda flutuante. E, como se sabe, na Holanda o aborto é legal, logo, os abortos cometidos neste barco, desde que em águas internacionais, são perfeitamente legais!
Como muito bem afirma a Assumida Mente no seu último post, este é um indício claríssimo de hipocrisia. E basta remeter-me ao que ela afirmou quanto à ida de portuguesas a Espanha para estar tudo dito, pelo que não vou repeti-la. Só acrescento que me parece que fechar as fronteiras com Espanha parece-me uma ideia plausível da imaginação deste governo... Tudo pode acontecer!
Há ainda três afirmações do Secretário de Estado dos Assuntos do Mar, Nuno Fernandes Thomaz, que gostaria de referir. Afirmou ele:
"É uma questão de legalidade e não de moralidade. Aceitar que terceiros viessem violar a nossa lei tornaria para nós mais difícil exercer a autoridade com os portugueses."
Para justificar o porquê de se ter invocado a saúde pública, o secretário de Estado disse:
"Sendo a pílula (abortiva) proibida em Portugal, se tencionam administrá-la significa que a trazem (a bordo). Por esse motivo (o barco) deverá ficar em águas internacionais."
A terceira pérola foi esta:
"O barco vem exercer actividades de saúde que têm de ser devidamente regulamentadas (pelas autoridades portuguesas), senão poríamos em risco a saúde pública. Consideramos que a passagem do navio não é inofensiva".Atente-se no pormenor de que as autoridades portuguesas pretendem regulamentar actividades de saúde que serão exercidas não em Portugal, mas em águas internacionais! A tentativa de confundir as coisas é claríssima nesta passagem! A prepotência destas afirmações parece não ter limites...
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